Esse sistema de
ensino se desvia dos verdadeiros princípios
da exegese bíblica e supõe que por existirem coisas do Antigo Testamento que
são citadas pelo Espírito Santo no Novo Testamento, isso significaria que elas teriam
se cumprido nos dias atuais na Igreja. Isso é assumir algo que o Espírito de
Deus não tinha a intenção de dizer.
Na verdade, como
regra geral, quando uma passagem do Antigo Testamento é citada no Novo
Testamento na forma de um cumprimento, isso será informado. Mas quando o
Espírito de Deus cita uma passagem do Antigo Testamento no Novo Testamento, porém
não diz que se trata de seu cumprimento, faz isso meramente para mostrar o
caráter de algo, ou então que o princípio envolvido coincide com os desígnios
morais de Deus. Compare João 19:36 com 19:37; Atos 1:16, 20 com Atos 2:16-21;
Atos 13:27 com Atos 13:47 etc. A Teologia do Pacto não observa este princípio
ao interpretar as Escrituras e infere coisas a partir de várias passagens que
não foram citadas com esse objetivo, chegando assim a conclusões errôneas como
resultado disso.
Os teólogos do
Pacto também são, com frequência, inconsistentes em seu método de “espiritualizar” as Escrituras. Eles
ensinam que as profecias do Antigo Testamento se cumprem alegoricamente nos
dias de hoje na Igreja. Todavia muitas passagens do Antigo Testamento se
cumpriram literalmente. Isso é impossível de se negar. Tome, por exemplo, as
maldições e juízos pronunciados sobre Israel. Se eles não andassem de acordo
com suas responsabilidades em seu relacionamento com Deus, conforme ditadas
pelas alianças, eram avisados de que seriam destruídos por seus inimigos e
levados cativos de sua terra. Essas coisas efetivamente aconteceram; as dez
tribos foram levadas para a Assíria e as duas tribos para Babilônia. Além
disso, as profecias relacionadas à primeira vinda do Messias — Seu nascimento
virginal, Sua vida e ministério, Sua rejeição, Sua morte e ressurreição etc. —
foram todas cumpridas literalmente. Os teólogos do Pacto admitem isso.
Sendo assim, os
teólogos do Pacto ensinam que somente algumas
profecias do Antigo Testamento se cumpriram de forma alegórica! Mas isso deixa
o estudante sério da Bíblia na incerteza. Qual parte da Bíblia deve ser tomada
literalmente e qual parte alegoricamente? E que autoridade ele teria para
selecionar e escolher uma e não outra? Os teólogos do Pacto dirão que as
bênçãos devem ser tomadas alegoricamente, mas que os juízos são literais.
Todavia, com que autoridade das Escrituras eles fazem essa distinção
qualificadora? Se fosse para ser assim, por que Deus não nos disse isso em Sua
Palavra?
Quando
examinamos esta ideia (as bênçãos do Antigo Testamento sendo cumpridas de forma
alegórica, porém os juízos de forma literal) descobrimos que muitas vezes tal
ideia não tem consistência. Muitas das bênçãos prometidas a Israel foram
cumpridas literalmente! Por exemplo, as bênçãos de Deuteronômio 27-31 se
realizaram nos dias de Josué e novamente nos dias de Davi e Salomão. Além
disso, as bênçãos prometidas de restaurar os filhos de Israel do cativeiro —
caso eles se humilhassem — se cumpriram literalmente nos dias de Esdras e
Neemias. E mais uma vez os teólogos do Pacto são forçados a admitir isso.
Portanto, os parâmetros desse método de interpretação não são seguidos por seus
próprios interpretadores. E por que deveríamos pensar que algumas partes do
Antigo Testamento se cumprem de forma espiritual ou alegórica quando Deus já
nos mostrou como pretende cumprir essas coisas pelo fato de ter cumprido muitas
delas de forma literal? Era de se esperar que, se Ele começou agindo dessa
maneira, irá continuar a cumprir as profecias que ainda restam de forma literal.
A interpretação
ortodoxa cristã da Bíblia vê um cumprimento literal da Bíblia. Isso não
significa que toda palavra ou frase encontrada na Bíblia seja literal, mas o cumprimento dessas coisas é literal. O
Espírito de Deus usa muitas figuras e símbolos na Palavra de Deus; não são
coisas literais, mas simbolizam coisas que são literais. Por exemplo, as
Escrituras falam do “sol” não brilhar
e das “estrelas” caindo do céu (Mt
24:29). Isso não poderia ser tomado literalmente. A maioria das estrelas são milhares
de vezes maiores que a terra, e se uma delas caísse na terra esta seria
imediatamente destruída. Estas coisas obviamente são simbólicas. Elas têm o
objetivo de representar que a grande apostasia que o Anticristo irá introduzir
resultará na supressão da luz divina (o sol) e da verdade para os homens, e que
muitos líderes dentre os homens (as estrelas) irão sucumbir nessas trevas
espirituais e abandonar seu conhecimento de Deus. Estas são coisas literais que
irão acontecer.
Os teólogos do
Pacto não veem problema em inferir coisas das Escrituras para fazê-las encaixar
em sua interpretação. Chamamos a isso de “fator
de correção arbitrária”. Um exemplo disso é a invenção dos termos “Pacto das Obras” e “Pacto da Graça” — dos quais as Escrituras não fazem qualquer
menção. Eles também dizem que a “nova
aliança” (ou “novo pacto” ou “novo concerto”, dependendo da tradução)
foi feito no tempo presente com a Igreja. Todavia não existe nada nas
Escrituras que ensine isso. Cada vez que é mencionada a Nova Aliança ou Pacto as
Escrituras declaram que não é algo que foi feito agora, mas algo que será feito no
futuro. O Senhor diz, “estabelecerei
uma nova aliança” e não “estabeleci
uma nova aliança”. Além do mais, quando essa aliança ou pacto for feita as
Escrituras dizem claramente que será “com
a casa de Israel e com a casa de Judá” — não com a Igreja (Hb 8:8-12). (Em
contraste, as bênçãos cristãs são, via de regra, vistas como possessão presente
dos crentes — Ef 1:3-14; “fomos feitos...”
— enquanto as bênçãos para Israel na profecia são futuras). O apóstolo Paulo
confirma isso declarando que “as alianças”
e “as promessas” pertencem aos seus
conterrâneos. Ele qualifica com exatidão quem são eles, não deixando qualquer
margem para dúvida, ao dizer: “meus
parentes segundo a carne, que são israelitas” (Rm 9:3-4). Isso jamais
poderia ser interpretado como uma companhia de crentes espirituais dos dias de
hoje que tenham sido chamados dentre os gentios, como ensinam os teólogos do
Pacto.
Os teólogos do
Pacto rejeitam a ideia de que as promessas feitas a Israel no Antigo Testamento
devam ser tomadas literalmente porque a Epístola aos Hebreus demonstraria
(segundo sua maneira de pensar) que aquelas coisas tiveram seu cumprimento em
coisas espirituais que agora temos no cristianismo. É verdade que a maneira de
se aproximar de Deus no Antigo Testamento — por meio de formas, cerimônias e
rituais — cedeu lugar a um “novo e vivo
caminho” no cristianismo, e que esse novo caminho é uma ordem de coisas
espirituais, não literais (Hb 10:19-22). O autor da epístola deixa bem claro
que toda aquela ordem exterior de adoração encontrada no Antigo Testamento deve
ser entendida figuradamente no
cristianismo (Hb 9:9). Todavia muitos capítulos nessa epístola mencionam também
que existem coisas que ainda estão por se cumprir em conexão com Israel, as
quais são distintas das coisas espirituais que temos no cristianismo. São
coisas literais. Portanto, a própria epístola aos Hebreus, que os adeptos da
Teologia do Pacto tentam usar na tentativa de provar que não haverá nada de
literal se cumprindo para Israel no futuro, diz sim que haverá.
Por exemplo, em
Hebreus 4 o autor menciona que “resta
ainda um repouso para o povo de Deus” (Hb 4:9). Isso se refere a algo que
irá ocorrer depois que terminar o
tempo do cristianismo na terra. Tem a ver com um dia futuro quando o Senhor
introduzirá o Seu povo em seu descanso final. Além disso, os capítulos 5-7
falam do sacerdócio de Cristo sendo segundo a ordem de “Melquisedeque”. Este é um aspecto futuro e milenial de Seu
sacerdócio, quando Ele irá reinar como rei e sacerdote, e um remanescente de
Israel será abençoado por Ele (Zc 6:13; Sl 110:1-4). No capítulo 8 o autor de
Hebreus mostra que a Nova Aliança será estabelecida “com a casa de Israel e com a casa de Judá”. O Senhor insiste que
isso ainda não foi feito, mas que é algo que irá fazer no futuro (“Estabelecerei...”
Hb 8:8-12).
Além disso,
Hebreus 9 menciona dois “tempos”
distintos que não devem ser confundidos — “o
tempo presente” (Hb 9:9) e “o tempo
da correção” (Hb 9:10). O tempo atual tem a ver com o cristianismo hoje,
mas o tempo de corrigir todas as coisas tem a ver com a nova organização da
terra no reinado público de Cristo. O versículo 11 segue falando “dos bens futuros”. Isso não poderia
estar se referindo ao cristianismo, pois ele tinha acabado de explicar no
versículo 9 que as coisas cristãs são coisas para “o tempo presente”. Esses bens futuros são as bênçãos de Deus para
Israel em um dia vindouro. O capítulo 10 menciona o Novo Pacto ou Aliança mais
uma vez, e deixa claro que é algo que Ele ainda fará com Israel no futuro (“Esta é a aliança que farei com eles depois
daqueles dias” Hb 10:16). No capítulo 12 temos a promessa de que o Senhor irá
abalar “não só a terra, senão também o
céu” (Hb 12:26-29), o que se refere ao tempo quando Seus juízos cairão
sobre a terra. Sabemos das Escrituras dos Profetas que essas coisas serão
entendidas por Israel quando eles forem restaurados ao Senhor e abençoados em Seu
reinado público.
O ponto que
queremos frisar em tudo isso é que ainda existe algo que virá para Israel no
futuro. Portanto, enquanto a Epístola aos Hebreus ensina que o cristianismo é
uma aproximação espiritual e celestial de Deus pelo Espírito Santo, isso não
significa que as bênçãos literais prometidas a Israel sejam nulas e sem efeito.
É inconsistente
para os teólogos do Pacto ensinarem que o Antigo Testamento deve ser
interpretado num sentido alegórico ou espiritual que teria se cumprido no
cristianismo de nossos dias, pois quando se chega à eclesiologia da Teologia do
Pacto (a doutrina e prática da igreja) eles adotam em muitas maneiras a ordem
literal e exterior da adoração de Israel como padrão para seus cultos de
adoração! Se tudo era para ser “espiritualizado” agora no cristianismo, por que
adotam tantas dessas coisas literais e as incorporam em sua adoração cristã?
A seguir temos
uma lista de algumas coisas que as igrejas que seguem a Teologia do Pacto
emprestaram do judaísmo do Antigo Testamento e praticam literalmente.
- Templos e catedrais literais como lugares de adoração.
- Uma casta especial de homens para oficiarem em favor da congregação.
- Instrumentos musicais para auxiliar na adoração.
- O uso de um coral.
- O uso de incenso para criar uma atmosfera espiritual.
- Vestes religiosas para os “Ministros” e membros do coral.
- Um altar literal (não sacrificial).
- A prática do dízimo.
- Observância de dias santos e festas religiosas.
- Registro dos nomes e censo da congregação.
É verdade que
muitas dessas práticas judaicas foram alteradas para serem adaptadas ao
contexto cristão, mas elas continuam trazendo os paramentos do judaísmo.
Outro exemplo de
como a Teologia do Pacto se afasta dos sãos princípios da exegese bíblica está
na inversão do significado de “Israel”
do Antigo para o Novo Testamento. Isso causa uma ruptura na revelação
progressiva da verdade nas Escrituras. Outro grande princípio da interpretação
da Bíblia — que estudantes da Bíblia fariam bem em observar — é que novas
revelações nunca contradizem as revelações já dadas. Um conceito no Antigo Testamento
não pode ser usado para significar o oposto no Novo Testamento, caso contrário
a Bíblia estaria cheia de contradições. À medida que as Escrituras iam sendo
escritas, Deus dava uma medida adicional de luz em certos assuntos, mas essas
novas revelações nunca contradiziam as anteriores. As Escrituras desdobram a
verdade como um prédio que está sendo construído; primeiro é lançado o
alicerce, depois é acrescentada uma estrutura etc. Uma coisa é construída sobre
a outra, e cada nova coisa adicionada não destrói o que veio antes. Portanto,
não pode ser (como supõe a Teologia do Pacto) que a nação de Israel, que é algo
literal no Antigo Testamento, perca sua literalidade no Novo Testamento.
O Israel literal
do Antigo Testamento não se transforma alegoricamente na Igreja do Novo
Testamento. Quando a ideia é colocada à prova descobrimos que não encontra
sustentação nas Escrituras. No livro de Atos Israel continua sendo chamado como
a nação literal de Israel em contraste com os gentios — e isso foi depois de a Igreja ter sido estabelecida
(At 3:12; 4:8, 10; 5:21, 31, 35; 21:28). Romanos 9-11 confirma isso. O termo “Israel” é usado em diversas ocasiões
nesses capítulos para os descendentes naturais de Abraão (“parentes” de Paulo “segundo
a carne”), mas nunca para uma companhia de pessoas chamadas dentre os
gentios. Além disso, se aquilo que os teólogos do Pacto ensinam concernente a
Israel fosse verdade, então a oração de Paulo por Israel não faria sentido: “O bom desejo do meu coração e a oração a
Deus por Israel é para sua salvação” (Rm 10:1). Por que iria ele orar para
que cristãos fossem salvos (caso a Igreja fosse Israel) se já estão salvos?
Além do mais, se Israel e Igreja são uma mesma companhia de pessoas, não
haveria necessidade de Paulo fazer distinção entre ambos, como ele faz em 1
Coríntios 10:32, onde diz: “Portai-vos de
modo que não deis escândalo nem aos judeus,
nem aos gregos, nem à igreja de Deus.”. Estas passagens
provam que a palavra “Israel” não
teve seu significado alterado no Novo Testamento; ela continua a ser usada para
os descendentes naturais de Abraão, mesmo depois de a Igreja ter começado. E as
Escrituras tampouco chamam a Igreja de “novo Israel”, como os teólogos do Pacto
tomam a liberdade de fazê-lo.
Estas coisas são
“non-sequitur”. Um “non-sequitur” é quando uma conclusão não
decorre de premissas estabelecidas. Trata-se de um salto na lógica do
raciocínio de alguém que acaba concluindo algo que não pode ser fundamentado.
Por exemplo, “Sou um homem da raça humana, e como nessa raça os homens
envelhecem e seus cabelos ficam grisalhos, e quanto mais velhos mais grisalhos
ficam, PORTANTO sou mais velho que o José porque meu cabelo é mais grisalho que
o dele”. Mas uma conclusão assim não é correta, pois José é vinte anos mais
velho que eu, apesar de seu cabelo continuar preto. É triste afirmar, mas a
Teologia do Pacto está marcada por esses non-sequitur
em suas interpretações equivocadas das Escrituras.
Traduzido de “A Dispensational or a Covenantal Interpretation of Scripture - Which is the Truth?”, por Bruce Anstey publicado por Christian Truth Publishing. Traduzido por Mario Persona.