O capítulo 11
apresenta os resultados do anúncio do Rei à nação. Ele mostra que a mensagem
não foi recebida pelo povo e, por isso, o Senhor foi rejeitado. Eles não O
queriam como seu Messias e Rei. Isto é visto no fato de que eles não quiseram
receber o ministério de João, o qual apresentava Cristo à nação (João 1:6-9,
29, 35), nem tampouco receberam o ministério do Senhor e de Seus apóstolos
(cap. 11:1-19). Consequentemente, o Senhor pronunciou um juízo sobre a nação, e
especialmente sobre aqueles que tiveram a oportunidade de testemunhar da maior
parte dos milagres feitos entre eles -- “Corazim”,
“Betsaida” e “Cafarnaum” (cap. 11:20-24). O Senhor aceitou Sua rejeição como vinda
de Seu Pai, que está acima de todas as coisas, e disse: “Sim, ó Pai, porque assim Te aprouve” (cap. 11:25-27). Ele então
chamou um remanescente de crentes para fora da massa de incrédulos com a
intenção de guiá-los a algo completamente novo nos desígnios de Deus, o que
estava prestes a ter início. Ele disse: “Vinde
a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei” (cap.
11:28-30). Ele não estava dizendo isso a incrédulos que precisavam ser
convertidos (como os evangelistas costumam tomar a liberdade de usar a passagem
na pregação do evangelho), mas a crentes fiéis na antiga dispensação que
estavam sobrecarregados por tentarem guardar todas as determinações da Lei e as
tradições dos patriarcas. Eles eram encorajados a seguir o Senhor na senda da
fé tomando sobre eles o Seu “jugo”
(os novos princípios do reino), por meio do qual encontrariam “alívio” ou “descanso” do fardo que era guardar a Lei.
Nos capítulos
12-13 o Senhor é visto rompendo Suas ligações com a nação. Isto está indicado por
uma série de afirmações e ações simbólicas. Neste ponto do Evangelho de Mateus
o Espírito de Deus reúne determinados eventos para demonstrar a mudança que
estava ocorrendo nos desígnios dispensacionais de Deus. Algumas coisas são
mencionadas para indicar o inevitável rompimento das tratativas do Senhor para com
Israel e o início de sua ação em alcançar os gentios.
Existem doze indicadores que apontam para esta
mudança dispensacional:
Primeiro, são apresentados dois incidentes nos
quais o Senhor parecia violar a Lei do Sábado (cap. 12:1-13). Na verdade os
judeus haviam interpretado Seus atos como transgressão da Lei, quando na
realidade o que havia sido violado eram apenas as tradições dos Fariseus. Não
existe qualquer passagem das Escrituras qualquer coisa que proíba pessoas
famintas de arrancarem algumas espigas de trigo e comê-las no Sábado, e nem na
Lei havia qualquer coisa contra executar atos de misericórdia no Sábado. Ao
violar as tradições dos Fariseus relacionadas ao Sábado (as quais os judeus consideravam
mais importantes que a Lei), o Senhor estava indicando que o Seu vínculo com a
nação estava rompido, vínculo este do qual a Lei era o selo. (Êx 31:16-17).
Ao responder a
crítica dos Fariseus o Senhor apontou para a ocasião quando os homens de Davi
estavam famintos e o sacerdote deu de comer a eles o “pão sagrado” (1 Sm 21:1-6). O sacerdote agiu assim porque quando
eles chegaram era hora de substituir o pão, e tendo em vista o fato de que o pão novo estava santificado “nos vasos” e pronto para ser colocado
no forno, enquanto o pão velho já era considerado “pão comum”. O ato de tirar o pão velho representava o fim da velha
ordem sob o rei Saul; sua substituição pelo pão novo apontava para a nova ordem
que viria com Davi. Já que Davi, o rei ungido de Deus, foi rejeitado, as
reivindicações da Lei concernentes às coisas santas tinham “de algum modo” caducado. Isto tem um significado na forma de
tipos. As coisas em Israel dos dias do Senhor também passavam por uma
transição. O Senhor usou este incidente para ilustrar que, uma vez que Ele, “o Filho do Homem” (título que Ele
assume em Sua rejeição) que “até do
sábado é Senhor”, fora rejeitado, as reivindicações do Sábado já não
valiam.
A segunda coisa que indicava que o Senhor
estava rompendo Suas ligações com Israel é que a partir deste capítulo Ele Se
afasta do povo várias vezes. Nestes capítulos transicionais do Evangelho vemos
várias vezes algo como: “E, partindo dali...”
ou “retirou-se dali” (cap. 12:9, 15:
13:1, 53; 14:13; 15:21, 29; 16:4 etc.).
Um terceiro indicador é que o Senhor
passava a “recomendava-lhes [aos
discípulos] rigorosamente que o não descobrissem” ou revelassem que Ele era
o Messias de Israel (cap. 12:16; 16:20; 17:9 etc.). Ele indicava assim que
cancelaria a comissão que havia sido dada a eles para convocar Israel para o
reino. (Isto não ocorreu realmente até Estêvão ter sido apedrejado pelos
líderes da nação em Atos 7). Ao fazer isso o Espírito de Deus cita Isaías
42:1-3 como um anúncio formal de que a “voz”
já não seria ouvida “pelas ruas”
(cap. 12:14-21). Isto significa que a pregação e apresentação pública do reino
já não seriam mais oferecidas à nação; tal missão estava sendo encerrada. A
citação de Isaías 42 acrescenta: “até que
ponha na terra a justiça; e as ilhas [gentios] aguardarão a Sua lei”. Isto
demonstra que o cessar da apresentação do reino a Israel não seria final, mas
ficaria postergado “até” outra
ocasião.
A quarta coisa é que a narrativa do
Evangelho de Mateus já não afirma que “é
chegado o reino dos céus” como tinha sido nos capítulos anteriores (cap.
3:2; 4:17; 10:7). A expressão “o reino
dos céus” continua sendo usada, mas já não diz que “é chegado”.
O quinto indicador de que o assunto estava
encerrado para a nação (ao menos temporariamente) é que os líderes responsáveis
em Jerusalém atribuíram o ministério do Senhor a Satanás, selando assim sua
própria perdição (cap. 12:22-37). Com isso eles estavam pedindo que fosse
lançado juízo sobre eles. O espírito que levou a nação a crucificar o Senhor
fica evidente nas acusações dos Fariseus. O Senhor declarou que o pecado deles
era uma “blasfêmia contra o Espírito”.
Algo assim não poderia ser perdoado — nem naquela geração e nem na geração
vindoura. Portanto, o juízo teria de cair sobre a nação.
Uma sexta coisa que demonstra que o Senhor
havia encerrado sua missão de apresentar o reino a Israel naquela ocasião é
vista em Sua recusa de dar aos escribas e Fariseus (os líderes) quaisquer “sinais” adicionais de que Ele era o
Messias, e isto por causa da incredulidade deles (cap. 12:38-45). Exigir outro
sinal quando tantos sinais já haviam sido dados era claramente um insulto à
demonstração das “as virtudes do século
futuro” (Hb 6:5) que Ele lhes tinha dado. Implicava que faltaria a Ele as
credenciais de Messias. Assim, depois da cura do homem com a mão mirrada (cap.
12:10-13), vemos claramente um fim nos milagres que haviam sido feitos diante
da porção responsável da nação. O Senhor retirou-se para as regiões além da
Galileia e continuou a fazer milagres ali, pois as pessoas naquela área ainda
não O tinham rejeitado formalmente (cap. 14:15-21; 15:21-39; 17:14-21).
Uma sétima evidência de que o Senhor iria
encerrar suas conexões com a nação é vista em Sua recusa em atender aos pedidos
de “Sua mãe e Seus irmãos” (cap.
12:46-50). Ele já não iria reconhecer Seus vínculos naturais. Isto significava
o rompimento de Suas ligações naturais e de seu relacionamento com a nação —
inclusive com os membros de Sua própria família.
No capítulo 13
há uma oitava evidência. O Senhor
levantou-se e saiu “da casa” (vers.
1). Esta foi mais uma ação simbólica demonstrando que as conexões exteriores
que tinha com a nação seriam rompidas. Ele assumiu uma nova posição
assentando-se “junto ao mar” (compare
com Atos 10:6), o que representa Suas intenções de alcançar os Gentios nesta
nova empreitada nos caminhos de Deus.
A nona evidência é que haveria uma nova seara
cultivada na lavoura de Deus pelo semear da “semente”
da Palavra de Deus nos corações dos homens (Lucas 8:11), por meio da qual
haveria fruto para Deus (cap. 13:1-9, 19-23). Portanto, Ele já não buscaria
fruto na seara de Deus segundo a antiga ordem de Israel.
A décima evidência é vista no fato de o
Senhor ter adotado um novo método de ensino em Seu ministério (cap. 13:10-17).
Deste ponto em diante no Evangelho de Mateus Ele usa “parábolas”. Antes disso Ele não usava, mas falava claramente ao
povo. Todavia, após ser rejeitado Ele adota este novo método de ensino. O uso
de parábolas não era para ajudar as massas a entenderem a verdade, mas tratava-se
de uma ação governamental visando esconder a verdade delas por causa de sua
incredulidade. Mas ao mesmo tempo seria
dado conhecer a verdade àqueles que tinham fé (os discípulos). Eles entenderiam
o significado das parábolas. É feita citação de Isaías 6:9 para confirmar que
Deus tiraria dos judeus a verdade, pois eles “fecharam seus olhos” em incredulidade.
A décima primeira evidência é que “o reino dos céus” ganharia um novo
significado. A partir de então ele teria um lado místico (cap. 13:11). Os “mistérios” concernentes ao reino seriam
explicados aos discípulos nas parábolas que se seguiriam falando do reino (cap.
13:24-30, 31-32, 33, 44, 45-46, 47-50; 18:23-35; 20:1-16; 22:1-14; 25:1-13).
Estas dez parábolas tem sido chamadas de “similitudes”
do reino, pois todas começam com a frase: “O
reino dos céus é semelhante a...”.
A décima segunda evidência de que a nova
dispensação estava chegando é que novas
revelações seriam feitas em conexão à nova fase do reino em mistério.
Algumas coisas que tinham sido deixadas secretas desde a fundação do mundo
seriam agora descortinadas (cap. 13:35).
* * * * *
Como já foi
mencionado, o Espírito de Deus escreveu o Evangelho de Mateus com estas imagens
dispensacionais entretecidas no texto para ilustrar a transição (do judaísmo
para o cristianismo) que, segundo os desígnios de Deus, estaria chegando após a
morte e ressurreição do Senhor. A nova rejeição é registrada no Livro de Atos
dos capítulos 8 ao 28 e continua nos dias de hoje. Ela é prefigurada no
ministério do Senhor em Mateus 13. O Senhor voltaria ao céu, passando pela
cruz, e a responsabilidade do “reino dos
céus” seria dada aos homens. Considerando que se tratava de uma ordem de
coisas totalmente nova, ela necessitava de alguma explicação adicional.
Portanto, a partir do capítulo 13 em diante o Senhor ensina os discípulos
acerca das novas características do reino dos céus nas parábolas chamadas de “similitudes”.
Nas três
primeiras similitudes no capítulo 13:18-33 o Senhor mostra que quando o
evangelho fosse levado, como tem sido feito no período atual, haveria uma
mistura de pessoas que seriam introduzidas no reino — algumas seriam crentes
reais, mas outras meros professos. Estas parábolas enfatizam o que Satanás está
fazendo para anular a obra de Deus no evangelho por meio da introdução de
pessoas (“joio”), espíritos malignos
(“aves do céu”) e más doutrinas (“fermento”).
As três
similitudes seguintes (vers. 44-50) identificam o que Deus está fazendo no
reino apesar do trabalho de Satanás. Ele está assegurando um “tesouro”, uma “pérola de grande valor” e peixes “bons”. Estas coisas se referem àqueles que compõem a Igreja.
As quatro
últimas similitudes no Evangelho (cap. 18; 20; 22; 25) enfatizam que o que nós deveríamos estar fazendo no reino.
Deveríamos ser cuidadosos em conservar um estado de espírito correto em relação
ao Senhor e a nossos irmãos temendo o juízo governamental de Deus (Mt
18:23-35). Deveríamos estar servindo na vinha do Senhor sem competição, ciúme
ou queixa (Mt 10:1-16). Deveríamos estar espalhando o evangelho por todo o
mundo (Mt 22:1-14). E deveríamos estar esperando pela volta iminente do Senhor
(Mt 25:1-13).
Estas
similitudes descrevem coisas que se sucederiam no reino durante o período da
ausência do Senhor, até o momento em que Ele voltaria (a Manifestação) na “consumação do século” (Mt 13:37-43).
Todavia, essas coisas não chegam longe o suficiente para contemplarem “o século futuro” — o Milênio — quando
estará em vigor a “dispensação da
plenitude dos tempos”. Todavia, estas imagens projetam o fato de que
existiria uma mudança dispensacional no modo de Deus agir, passando da Lei para
a Graça.
Traduzido de “A Dispensational or a Covenantal Interpretation of Scripture - Which is the Truth?”, por Bruce Anstey publicado por Christian Truth Publishing. Traduzido por Mario Persona.